KI TISSA 2023 - 5783

Na parashah KI TISSA, a Torah nos fala sobre o erro de Arão no episódio do bezerro de ouro, e a reação de Moisés à falta de seu irmão.

Arão havia sido designado por D-us para ajudar Moisés na missão de tirar os filhos de Israel do Egito.  Algumas pragas, inclusive, foram operadas por intermédio dele. E o próprio Moisés, antes de se ausentar, instruiu os anciãos de Israel para que se dirigissem a Arão, caso tivessem alguma questão.
Ou seja, Arão era irmão de Moisés, designado por D-us como co-líder, e com a delegação de autoridade necessária para aquela situação.
Moisés confiava em Arão, e nele se apoiava. Convém lembrar que no início, antes mesmo de se apresentar por primeira vez ao faraó, Moisés resistiu bastante ao chamado, e só aquiesceu quando D-us indicou Arão para ajudá-lo.

Então agora Moisés retorna, e o que ele encontra?
O povo em idolatria perante um bezerro de ouro.
Se fosse “apenas isso” já seria terrível, mas havia um agravante especialmente doloroso para Moisés, a participação de seu irmão naquela tragédia.
E além das óbvias questões afetivas entre irmãos, sabemos que parte considerável do que D-us dissera a Moisés naqueles quarenta dias, dizia respeito especificamente ao ofício sacerdotal de Arão e seus filhos.
Afetos e propósitos ministeriais tão elevados, desafiados pela realidade tão baixa à sua frente.

E a explicação que Arão dá também não ajuda.
Escusas como a propensão do povo para o mal, o pedido deles para fazer deuses, a incerteza quanto à demora de Moisés, não justificam a irresponsabilidade de Arão.
Não fosse a gravidade da situação, seria até cômico ouvir Arão dizer que pediu ouro, o povo lhe deu, então ele apenas lançou no fogo e saiu este bezerro!

Há ao menos dois aspectos fundamentais na atitude de Moisés perante o fato consumado à sua frente.

Primeiro, ele não se permitiu perder a clareza.
Por mais doloroso que fosse, Moisés manteve a lucidez e identificou a situação corretamente.
Arão, por sua passividade irresponsável, havia trazido grande pecado sobre o povo, deixando-o desenfreado, à solta, para vergonha.

Segundo, ele continuou.
Com ou sem Arão, havia um propósito de D-us que Moisés devia, e agora sem reservas ele também queria, realizar até o fim, cumprindo cabalmente a carreira que lhe estava proposta.
Moisés percebe o pecado de Arão, o repreende, mas não se detém para ficar brigando com ele.
Moisés simplesmente continua, para fazer o que tem que fazer, em sua responsabilidade pactual perante D-us.

Sem dúvida Moisés teria preferido poder contar com a ajuda de Arão.
Mas se o mesmo D-us soberano que havia posto Arão para ajudá-lo, agora o faria caminhar sem a colaboração do irmão, ainda assim ele seguiria em frente.
E essa determinação de Moisés eventualmente também ajudou na restauração do prórpio Arão.
Apesar de tudo, D-us manteve o chamado de Arão, ao mesmo tempo em que ensinava Moisés a caminhar com ou sem a ajuda humana esperada.D-us consertou tudo, e ficou registrado nas Escrituras que Ele conduziu Israel Seu povo, como rebanho, pelas mãos de Moisés e de Arão.

É muito bom quando podemos contar com a ajuda de familiares, irmãos e amigos, é o ideal, mas precisamos também estar dispostos a seguir sem eles, se assim D-us mandar.
Não temos o direito de negligenciar nossa responsabilidade pactual perante D-us, porque não estamos sendo compreendidos ou ajudados como gostaríamos.

Jesus é o Filho de D-us, mas também foi homem.
E como homem era membro de uma família de vários irmãos e irmãs.
Filho de José e Maria, irmão de Tiago, José, Judas e Simão, e ainda havia as irmãs, cujos nomes não sabemos.
E teria sido ideal, segundo nossa perspectiva humana, que sua família, ao menos sua família, o compreendesse e o ajudasse.
Mas não foi assim.
E ele também teve que manifestar, não poucas vezes, a ordem de prioridades.

Quando sua mãe e seus irmãos vieram ter com ele, e não podiam aproximar-se por causa da quantidade de pessoas, e o anunciaram a Jesus, ele não saiu correndo para atendê-los, mas aproveitu aquela situação para ensinar a todos, inclusive a nós, que sua mãe e seus irmãos são aqueles que ouvem a Palavra de D-us e a praticam.
Jesus não estava desprezando seus familiares, ou negando seus laços de parentesco humano.
Ele estava simplesmente reposicionando as prioridades conforme D-us.

Em certa ocasião, quando uma festa de Sucot estava próxima, seus irmãos o aconselharam a ir da Galiléia para a Judéia. A razão parecia muito lógica, ninguém que procure ser conhecido em público realiza seus feitos em oculto, então Jesus deveria ir para a judéia durante aquela festa para que todos vissem suas obras.

Se parássemos aqui, poderíamos pensar nos irmãos de Jesus como bons conselheiros para sua agenda.
Mas o texto continua, e João nos diz em seu Evangelho que nem mesmo seus irmãos criam nele.
Ora, se não criam nele, que tipo de ansiedade motivava seus conselhos?

Jesus sabia da incredulidade de seus irmãos, e por mais doloroso que isso fosse, essa era a realidade com a qual ele tinha que lidar.
Jesus tinha sua agenda, seu tempo, e não poderia permitir interferências, nem mesmo de familiares.
As interferências às vezes podem nos fazer agir conforme a expectativa, para agradar, ou exatamente na direção contrária, para tentar provar autonomia.
Jesus não caiu em nenhuma dessas armadilhas, ele simplesmente fez o que tinha que fazer, na hora e do modo que devia ser feito. E depois que seus irmãos subiram para a festa, então, subiu ele também, não publicamente, mas em oculto.
A questão não era seguir ou não seguir o conselho dos irmãos, mas sim fazer a vontade de D-us, em tempo e lugar.

E essa determinação de Jesus, que obviamente não estava limitada àquela festa, mas o fez continuar até a morte, e morte de cruz, acabou transformando também seus irmãos.
Um deles, Judas, é o autor da epístola bíblica em que, por reverência, se identifica como servo de Jesus Cristo e irmão de Tiago, também irmão do Senhor, e também autor de uma outra epístola bíblica.
Portanto, ao menos dois dos irmãos de Jesus, outrora incrédulos, vieram a crer, e não apenas crer, mas D-us os usou como instrumentos humanos para nos transmitir a Palavra escrita.

E é nas Escrituras que aprendemos a manter a perspectiva lúcida da realidade, mesmo que nos decepcione naquele momento, não parar para ficar brigando, mas olhar com compreensão as fraquezas alheias, considerando que as nossas podem ser muito piores, pois não somos Moisés nem Jesus, e seguir adiante, sempre seguir em frente, conforme o propósito de D-us para nós.

Ryby

08/03/23 - 15 Adar 5783

Desde 2004 a serviço de Yeshua HaMashiach